sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Trabalho com charges

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O gênero em destaque é "charge", mais especificamente "charge

política". O prof. pode trabalhar com o aluno o reconhecimento de

características de conteúdo e de forma (frases curtas, possibilidade

de haver fala dos personagens, o "destronamento" - no sentido que

Bahktin aponta em seus estudos sobre o humor na revolução francesa -

de personalidades políticas, a referência a fatos recentes, o lado

meio "datado" das charges, o seu caráter sintético, a exigência de

conhecimento prévio sobre os personagens e seus papeis sociais, os

traços caricaturais dos desenhos etc.



É possível o prof. buscar a intertextualidade entre a charge e textos

(principalmente de outros gêneros jornalísticos, como notíciais,

editoriais, colunas, artigos etc.) recentes, que possam ser

ferramentas para o aluno entender melhor a charge e perceber, em

funcionamento, o que é intertextualidade. È também importante discutir

se a charge é ou não um texto (defenderíamos que sim, com base na

definição de "texto" de Ingedore Koch).



Na verdade, o professor trabalharia muito mais com perguntas do que

com afirmações. Ao final, sim, poderia tentar uma síntese teórica e

interpretativa. As perguntas mais importantes para trabalhar a charge

são, ao meu ver: Em que lugar vocês acham que esta charge foi

veiculada / publicada? O travessão representa o quê? (R: a fala do

personagem). Os textos que lemos de outros gêneros jornalísticos nos

ajudam a entender melhor a charge? O desenho da charge é fidedigno?

Quem são esses personagens? Que função ocupam? Haverá punição dos

"retratados" contra quem desenhou? (pode-se discutir aqui o

cerceamento de ideias e o destronamento no sentido bahktiniano) O que

significa a palavras "cinzas"? A data da publicação da charge tem a

ver com isso? (provavelmente a charge foi próxima à quarta-feira de

cinzas) O gesto dos personagens representam o quê? (estão cabisbaixos,

pensativos) Há humor? Como funciona o humor? (a surpresa, o

destronamento, a caricatura, o deslocamento de sentido das palavras

"cinzas") As vestimentas dos personagens também se referem a algo?

(provavelmente fantasiados para o carnaval) Isso é um texto, é um

gênero? Vocês já viram esse tipo de texto em outros lugares? O que há

em comum entre esta charge e outras que vocês conhecem? (o prof. pode

trazer outras charges; a ideia com esta pergunta é trabalhar o fato de

os gêneros serem tipos cristalizados / repetitivos de texto, que têm

uma finalidade sociail, uma estrutura e um conteúdo próprios). Há

hipérbole? (exagero, outra característica da charge: hipérbole nos

traços, nas ideias etc.) O que há de real e o que há de ficção na

charge? É um gênero que pende mais para o ficcional ou para o real?

Todo texto de jornal é imparcial e retrata um fato da realidade? (a

charge é gênero jornalístico e não "reflete" a realidade; o prof.

pode, num segundo momento, questionar exatamente se algum texto pode

realmente ser imparcial, pois todos os sujeitos estão imersos no

discurso).



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A frase "eles só pensam naquilo" foi tirada do contexto sexual

(lembrado pela figura da "mulata" sambando) e traziada para o contexto

político (da disputa pela faixa presidencial). O personagem é

Garotinho, político carioca. Provavelmente, a charge fora publicada em

um período próximo ao carnaval, pois é comum às charges fazer

referência a fatos e datas específicas. Isto porque a charge é

sintética, ela não pode discorrer muito, contextualizar. Então, ela

pega fatos já contextualizados para fazer humor com eles. Isso exige

um conhecimento prévio do leitor, e também que este leitor estabeleça

relações intertextuais (entre a charge e outros gêneros, especialmente

jornalísticos) e interdiscursivas (entre o discurso destronado e o

discurso oficial realmente dito ou atribuível aos personagens

"reais").



A charge trabalha o implícito, o não-dito expressamente, mas que pode

ser reconstituído, a partir do conhecimento do leitor e do suporte

intertextual que ele tenha. A charge traz explicitamente o que existe

em outros textos, embora nem sempre de forma tão visível: a

necessidade de o leitor completar os sentidos do texto, isto é, o

leitor não é um ser passivo. Por haver tantos implícitos, o leitor é

sempre convocado a compreendê-los e desvendá-los, sob pena de o humor

não funcionar.



O prof. pode trabalhar com os deslocamentos de sentido das palavras

como ferramenta para produzir o humor, pode trabalhar com a junção

palavra-imagem no gênero charge, com provérbios populares (propor aos

alunos atividades em que os provérbios sejam tirados de seu contexto,

com o objetivo de gerar humor), trabalhar com outros gêneros de humor

(especialmente outros que também sejam sintéticos e contenham muitos

implícitos, como é o caso da piada ou dos "adivinhas").

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