sábado, 23 de maio de 2009

Conclusão: Existem gatos que são aquáticos!

(Fundação Carlos Chagas - Concurso TRT-PR / 2004) Observe a construção de um argumento:
Premissas: Todos os cachorros têm asas.
Todos os animais de asas são aquáticos.
Existem gatos que são cachorros.
Conclusão: Existem gatos que são aquáticos.
Sobre o argumento A, as premissas P e a conclusão C, é correto dizer que
(A) A não é válido, P é falso e C é verdadeiro.
(B) A não é válido, P e C são falsos.
(C) A é válido, P e C são falsos.
(D) A é válido, P ou C são verdadeiros.
(E) A é válido se P é verdadeiro e C é falso.


Comentários:

Dizem que todo poeta (inclusive os formais) e todo linguista (exceto os formais) são inimigos da lógica. Penso, entretanto, que esses poetas e linguistas querem o rigor da lógica para lutar contra a lógica.

Ironias à parte, convém ressaltar que a linguistica tem seus méritos ao desbancar a lógica e defender que a língua tem uma lógica própria, ou uma falta própria de lógica. E a poesia também.

Conheço amigos da área de exatas que me disseram que, após estudar lógica, passaram a dominar melhor a língua. Sei lá, acho que passaram a se enganar na língua de um jeito diferente. A lógica pode ser muito útil à linguagem matemática e computacional, mas encontramos na língua um sem-número de falhas a desmentir a lógica.

Esse mesmo amigo disse que a língua portuguesa era falha, pois, quando dizemos "Eu não vi nada", uma negação anularia a outra, resultando em uma afirmação: "Eu vi algo".

Puxa, que pensamento rasteiro. A lingua é falha sim, mas não só a língua portuguesa. E, graças às falhas da língua, vemos que a lógica também é falha. Inclusive, a dupla negação também existe no francês: "Je ne .... pas...". A dupla negação talvez seja mais uma "ratificação" da negação do que uma "retificação" dela.

Interessante dizer que, mesmo a gramática gerativa - formal por natureza - não é tão formalista quanto esse meu amigo lógico, pois ela considera "Eu não vi nada" como uma frase com sentido de negativa e busca formalizar (às vezes) explicações para esse tipo de construção.

Bom, vamos à questão que abre esse post.

Um argumento pode ser válido ou inválido. Será válido se sua conclusão for resultado necessário de suas premissas.

Sobre as premissas e a conclusão, podem ser verdadeiras ou falsas.

Assim, temos na questão acima que as premissas e a conclusão são falsas e o argumento como um todo é válido(!). Isso porque a lógica diz não se preocupar com a verdade das coisas (sempre refutáveis), mas com a estrutura formal.

Entretanto, para responder à questão, é preciso saber que, no mundo, cachorros não têm asas, que nem todo animal de asa é aquático, que não existe gato que seja cachorro e que não existe gato aquático.

A validade do argumento parte do pressuposto de aceitação das premissas. Falsas ou verdadeiras, as premissas são aceitas e, se não contraditórias entre si, delas resultar uma conclusão sempre inequívoca, o argumento como um todo será válido.

Para acharmos a validade do argumento, podemos construir conjuntos (seria melhor desenhá-los):

Premissa 1 - Todo cachorro está contido no conjunto dos animais com asas; (Desenhe um círculo dos cachorros dentro do círculo dos animais com asas)

Premissa 2 - Todo animal com asa está contido no conjunto dos animais aquáticos; (Desenhe um círculo dos animais aquáticos abarcando todos os animais com asas; logo, abarcando também todos os cachorros)

Até agora, concluímos que todo cachorro é animal aquático, pois, se os cachorros estão dentro do conjunto dos animais com asas, e os animais com asa estão dentro do conjunto dos animais aquáticos, todo cachorro pertence ao conjunto dos animais aquáticos.

Premissa 3 - Sabendo que existem alguns gatos que são cachorros, e sabendo que todo cachorro é aquático,

Conclusão - Concluímos que alguns gatos (pelo menos aqueles que são cachorros) são aquáticos.

A conclusão é decorrência necessária das premissas, pois não é possível que algum gato não seja cachorro. Assim, o argumento como um todo é válido, apesar de as premissas e a conclusão serem falsas.

Gabarito C.

E se a conclusão fosse: "Existem gatos que não aquáticos"?

Essa conclusão não seria necessariamente verdadeira; o que se sabe é que há gatos aquáticos, mas a questão não disse se, além desses, existem outros gatos. Estaríamos diante, portanto, de um sofisma, isto é, uma cadeia argumentativa cuja conclusão não é resultado necessário das premissas.

O mesmo ocorreria com "Não existem gatos aquáticos".

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